A primeira pesquisa Fipe Zap de aluguéis de 2015 foi recebida com fogos de artifício e pompa pela mídia, principalmente porque trouxe um dado interessante: os aluguéis subiram menos que o IPCA, índice oficial de inflação calculado pelo IBGE, segundo a própria chamada do relatório, copiada por vários veículos de imprensa:
“Inflação ao consumidor sobe três vezes mais do que os preços de locação”.
Enquanto o IPCA chegou a 7,14% em 2014, o índice dos aluguéis subiu 2,38%.
A primeira reação é: como isso acontece se os aluguéis são reajustados por contrato pela inflação?
Na verdade há um pequeno truque nesta chamada. Usou-se o IPCA ao invés de usar o IGP-M, que é o índice tradicional para reajuste de aluguéis. É muito interessante como a informação apresentada influencia nossas opiniões. Então, para entender um pouco melhor o comportamento dos aluguéis seria legal comparar com o IGP-M que avançou apenas 3,67% em 2014 (lembrando que os aluguéis subiram 2,38%).
A chamada para a notícia não ficaria tão chocante: “Inflação do atacado sobe levemente mais do que os preços de locação”.
Com este ponto importante esclarecido, ainda resta uma outra questão: afinal de contas, se todos os contratos de aluguéis são reajustados pelo IGP-M, como os preços de locação sobem menos?
Aí entra em cena um pouco de interpretação. Na verdade, os aluguéis continuam sendo reajustados por contrato pelo IGP-M, porém aluguéis novos e renegociações de aluguéis vencidos não estão conseguindo os mesmos preços que os aluguéis mais velhos.
Sejam bem-vindos ajustes negativos de aluguéis, só que não
A média dos novos aluguéis ou renovações de contratos vencidos tem ocorrido em preços menores do que os aluguéis mais velhos.
Em alguns casos, as renegociações acabam com ajustes menores do que a inflação. Em outras palavras, prepare-se para negociações mais duras nos contratos de aluguéis que vencem em 2015 ou mesmo para contratos com baixas multas de cancelamento.
Porém, aqueles contratos em vigor continuam recebendo o devido aumento pelo IGP-M.
Confirmação da tese
Em momentos de crise econômica como a atual, há poucos tipos de compradores / locadores que preferem seguir em frente com compras e aluguéis. São, por exemplo, as pessoas que estão saindo de casa, seja para casar, estudar em outra cidade ou porque querem independência.
A pesquisa da Fipe Zap indica que 48% das pessoas que compraram imóveis nos últimos meses pretendem morar sozinhas.
E advinha qual foi o tipo de imóvel cujo aluguel conseguiu acompanhar o IGP-M nos últimos tempos na cidade de São Paulo? Foram exatamente os apartamentos de 1 dormitório que se encaixam no bolso desse primeiro comprador / locador. Resultados muito interessantes que só confirmam nossa tese.
Não compare laranjas com maçãs
Há outro ponto importante. Um famoso canal de TV tem um quadro de finanças pessoais. A pergunta enviada ao especialista era: vale a pena investir em imóveis para aluguel? A conta que o apresentador apresentou era de que a taxa de aluguel (aluguel mensal / valor do imóvel) era na média de 0,4% ao mês e, comparando com a rentabilidade da poupança de 0,6%, levava a uma conclusão de que não valia a pena.
Para quem se lembra, não é aconselhável fazer a comparação da rentabilidade de um imóvel com a pobre poupança. As métricas de comparação precisam ser mais exigentes.
Mas vamos entrar na brincadeira e comparar o retorno do aluguel com a poupança. Também falamos nos relatórios que existe uma grande diferença entre o yield do aluguel (ou taxa de aluguel, como chamou o economista) e a taxa interna de retorno (TIR) de um imóvel para aluguel.
Um aluguel com 0,4% de yield significa uma taxa interna de retorno (TIR) MAIOR do que a poupança. O imóvel tem sim um retorno maior do que a poupança, mesmo com esse yield de 0,4% ao mês. Os números indicam que, na verdade, valeria a pena investir no imóvel. De vez em quando a minúcia da metodologia de análise é essencial. Da água para o vinho, o suficiente para provocar uma mudança de 180 graus na decisão.
Até imagino o economista tentando convencer os editores do jornal a incluir uma explicação da diferença entre o conceito de TIR e yield de aluguel. E posso ver também o editor ou o próprio economista chegando à conclusão de que o conceito é muito complicado para um segmento dentro de um jornal na TV.
Autor:Marcio Fenelon
Fonte: Cartasdaiguatemi.com.br
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