Buscando nas lembranças dos tempos em que residia próximo às margens do rio Acre, bairro aeroporto velho, resolvi resgatar um pouco das alagações vivenciadas pelos residentes de Rio Branco.
Dessa forma encontrei uma pesquisa elaborada pelo Reginâmio Bonifácio de Lima (Historiador e Escritor) e Pedro Bonifácio de Lima (Geógrafo), que merece o devido destaque, dada a objetividade e informações disponibilizadas.
Segundo eles, o rio Acre localiza-se na Bacia Sedimentar Amazônica, situada na Província Amazonas-Solimões. Por ser uma área Equatorial situada em baixas latitudes, possui um clima quente e úmido (Equatorial). Região de baixa latitude, apresenta médias térmicas mensais elevadas que variam e estão acima dos 24 °C.
Embora as médias térmicas estejam acima de 24 °C em toda a região (exeto porções restritas do planalto das Guianas), o regime de chuvas apresenta diferenças importantes conforme a atuação dos diferentes sistemas atmosféricos. Verificam-se totais anuais superiores a 2.500 mm e ausência de estação de seca em toda a Amazônia ocidental, onde a presença das BP (baixas pressões) equatoriais é quase permanente. Por outro lado, há uma diagonal subúmida que se estende de Roraima ao sul do Pará, chegando até Rondônia e parte do Acre, cujas médias pluviométricas são menos elevadas, apresentando alternância da estação seca e da chuvosa e caracterizando um clima equatorial subúmido. (ROSS, 1996, p. 103).
O rio Acre se situa na Região Amazônica, que tem um sistema atmosférico quente e úmido, é uma região propícia à alta pluviosidade. Uma das características mais comuns do rio Acre são as mudanças de direção do seu curso. A rede de drenagem é bem distribuída, correndo sobre rochas sedimentares, não formando cachoeiras. O rio apresenta forma meândrica, com pequenos trechos retilíneos. A grande quantidade de curvas que o rio apresenta ocasiona a formação freqüente de bancos de areia em seu leito. De mesma forma, o rio Acre transporta grande quantidade de sedimentos em suspensão, o que confere às suas águas uma coloração turva, típica de um rio de “água branca”.
A dinâmica fluvial do rio Acre envolve um fenômeno muito comum que é o deslizamento das margens. A erosão não ocorre apenas no “perímetro urbano”, mas também no “rural”, sendo que os impactos na zona rural, em alguns trechos, são menores, porque a mata ciliar e a mata de terra firme são mais preservadas, com muitas canaranas adaptadas à umidade, na margem do rio, ajudando a conter a erosão.
Nas enchentes, as margens dos rios ficam saturadas de água. No início da vazante, quando o nível da água começa a baixar, a pressão hidrostática diminui e a água anteriormente retida nas margens é liberada. As margens deslizam, então, de forma rotacional, ou em pacotes, verticalmente.
O rio Acre não é um rio uniforme, ele tem um desnível em seu leito, com algumas partes mais rasas e outras mais fundas. Esse desnível é ocasionado pela retirada de sedimentos pelo próprio rio. Devido à velocidade e o poder de erosão do fundo do rio, o atrito da água no fundo consegue arrancar muitos sedimentos com facilidade, fazendo “marmitas” gigantes e causando essas deformações.
Durante seu percurso, o rio Acre constantemente realiza um trabalho de erosão, transporte e deposição. Ele ainda não está com o seu canal definido, tem essa mobilidade de meandro e vai deixando ao longo do caminho meandros abandonados, também conhecidos como paleocanais. Pela própria dinâmica do rio Acre é possível que daqui a alguns anos, geologicamente, o rio deixe de contribuir para a vida nesses paleocanais.
O intemperismo que predomina no rio Acre é o mecânico ou físico, por causa da quebra dos barrancos e dos movimentos de massas.
No rio Acre, o transporte de materiais pelas águas se processa por suspensão, rolamento e saltação. O depósito do material detrítico e do dissolvido ocorre de modo seletivo. Quando as águas atingem os setores dos vales de menor inclinação, aproximando-se dos chamados níveis de base, onde ocorrem os processos de sedimentação, primeiro são depositados os materiais mais grosseiros e pesados, depois os finos e leves. A ação das águas pluviais e fluviais é marcante nos ambientes de clima temperados e tropicais, onde a água é mais abundante.
As ações antrópicas como os desmatamentos das margens do rio para a extração de madeira ou as queimadas da floresta para a criação de gado causam alguns danos irreversíveis ao meio ambiente. Com as constantes queimadas e desmatamentos surgem cicatrizes no solo como os filetes, ravinas e voçorocas, além de intemperismo físico ocasionando as remoções de massa.
É surpreendente a quantidade de áreas desmatadas nas margens do rio Acre, o que acaba desprotegendo o solo e aumentando a erosão e o assoreamento do rio.
A erosão provoca remoção de massas em função da água da chuva que satura o solo, como esse solo saturado não é consolidado, por efeito de gravidade, ele vem a baixo. O material removido se desloca barranco abaixo em direção ao rio, provocando o assoreamento, que já está em estado bastante avançado. Esses movimentos de massa são mais freqüentes nas áreas com maior declividade. Nos últimos anos, esse fator tem se agravado, principalmente na cidade Rio Branco, prejudicando a população, causando perda de casas, ruas, prédios, etc.
O fluxo das águas do rio Acre na Capital acreana e, em específico, nas áreas baixas como no Terceiro Eixo Ocupacional de Rio Branco, ocasiona um aspecto que mexe com a vida dos moradores da localidade ano após ano. Quando a cota de alerta do nível das águas do rio atinge a régua na marca de 13,5 metros, no Terceiro Eixo, a área baixa existente na parte norte do bairro Ayrton Senna, a qual faz divisa com o Sul do Aeroporto Velho, bem como a parte norte-noroeste do Aeroporto Velho, ficam parcialmente cobertas pela água.
Um dado preocupante, que ao mesmo tempo chega a intrigar, é o fluxo de águas do rio Acre. A cada oito ou nove anos o rio tem seu leito tomado por uma grande quantidade de águas no inverno. Os moradores mais antigos, que vivem há décadas às margens do rio, dizem que “no ano em que as mangueiras dão muitos brotos em novembro”, intensificando o período de frutificação, esse é o período que o rio alcança os mais altos índices do nível de água ao longo de seu leito.
Em nossa equipe, embora disponhamos de dois professores de geografia, não dispúnhamos de geógrafos que estudassem o fluxo e a dinâmica das águas na Bacia do Alto Acre. Não dispomos de trabalhos que falem desse assunto em nossa Capital. O que mais se aproxima e até enseja um estudo de fluxo de águas é o trabalho do professor Claudemir Mesquita. As grandes cheias do rio Acre, segundo noticiado em jornais que circularam na Capital acreana nas décadas de 1970 e 1980, como “Varadouro”, “Nós Irmãos”, “O Rio Branco”, além de diversos relatos orais de moradores que viram e sofreram com as alagações, nos fazem pensar na real possibilidade de existência de um fluxo contínuo e periódico de águas, que atinge a cidade de Rio Branco e todas as cidades do Vale do Acre a cada oito ou nove anos.
Houve algumas grandes alagações em Rio Branco, e, nos últimos anos, pelo assoreamento do leito dos rios, o desmate das florestas ciliares e a poluição dos mananciais e fluxos de água que deságuam no rio Acre, vemos crescer, a cada grande alagação, o índice de água que atinge a expandida e “desordenada ocupação” da cidade de Rio Branco.
Um senhor cearense que entrevistamos afirmou que, em 1952, houve um grande alagamento em suas terras, no município de Porto Acre. Em suas palavras: “uma alagação como nunca vi igual”.
Em 1961, no mesmo município de Porto Acre, fala-se de uma grande enchente.
Há registros de que em 1970 houve uma grande alagação que atingiu o Vale do Acre; em 1971, houve uma alagação um pouco menor.
Em 1979 e, novamente, em 1980, houve duas grandes alagações que atingiram o Vale do Acre.
Em 1988 há registros de que outra grande alagação ocorreu também no Vale do Acre. Foi a maior alagação registrada na história “urbana” de Rio Branco, até então. O IBGE e a PMRB já haviam mostrado, em seus trabalhos e relatórios, a grande probabilidade de isso ocorrer.
Entretanto, a alagação de 1997 sobrepujou em quase um metro a de 1988, assim, mostrando o índice crescente e preocupante de assoreamento dos canais e leitos onde fluem as águas dos rios que passam pela Capital. As enchentes não ocorreram apenas no rio Acre, mas também no Antimary, no São Francisco, dentre outros rios e igarapés. Mais da metade de Rio Branco ficou submersa e uma área correspondente a mais de dois terços do município de Sena Madureira também ficou embaixo das águas.
Em 2005, houve uma grande alagação que atingiu todo o Vale do Acre, inundando parcialmente várias cidades.
Em 2006, o índice registrado de áreas atingidas pela alagação foi um pouco menor, se comparado ao das áreas atingidas na alagação anterior. É como se houvesse uma expansão de volume de águas em determinado período e um recuo durante vários anos, até um próximo alagamento.
Por nossos cálculos, e não somos geógrafos ou estudiosos especialistas em águas, afirmamos que ao se comprovar o ciclo de intensidade de águas (embora seja necessário confirmar cientificamente a periodicidade) é muito provável que ao permanecerem as atuais condições climáticas e pluviométricas, no ano de 2014, Rio Branco passe pela maior alagação de sua história. Asseguramos ainda, que não estamos sendo irresponsáveis ou alardeadores de notícias inverídicas, tampouco agimos como adivinhadores. Afirmamos sim, com todas as letras, que algumas áreas – como por exemplo, as que fazem parte da expansão da cidade para a parte baixa do Segundo Distrito da Capital, bem como para as áreas baixas do Primeiro Distrito, com ênfase na Expansão do Terceiro Eixo – ambas atingidas pelo rio Acre – e das áreas próximas aos bairros Cadeia Velha, Adalberto Aragão, e a expansão do bairro São Francisco que se estende rumo ao rio Acre, numa área de incidência do Rio São Francisco – sofrerão grandemente com o aumento das águas.
Precisamos nos alongar por várias páginas, falando do ciclo das águas, para alertar a quem interessar possa e ao poder público sobre o fato de que estudos mais aprofundados precisam ser feitos, e que, a expansão da cidade, não deve se dar rumo ao Igarapé da Judia, haja vista que se o novo Distrito Industrial realmente for instalado onde está programado pelo Plano Diretor, as águas desse igarapé ficarão impróprias para consumo. Além disso, a Estação de Tratamento de Água da Judia não mais terá água para tratar e abastecer o Segundo Distrito, porque o igarapé morrerá. O abastecimento da área ficará drasticamente comprometido, sendo necessário que a ETA II (que ainda não está em funcionamento, mas que tem o dobro da capacidade da ETA I) distribua água potável para a regional do Segundo Distrito.
Enquanto isso, no Primeiro Distrito, as áreas dos bairros do Terceiro Eixo – mais conhecido como Baixada da Sobral –, juntamente com as áreas situadas no Segundo Distrito que são adjacentes ao Taquari, Seis de Agosto e Baixada da Cadeia Velha, representando mais de um terço da população da Capital, sofrerão ainda mais por causa das águas. Eles já sofrem com falta de trabalho, saúde, educação, moradia, falta de bem-estar social. A cada ano, durante alguns meses, sofrem com a tensão de uma possível cheia do rio, que ameaça atingir suas residências. Sofrerão ainda mais com o “inchamento” do local pelo grande número de pessoas morando em áreas de terra tão densamente ocupadas, com o aumento do fluxo das águas, tomando suas residências e com o descaso dos governantes para com sua “situação de desgraça”.
Desde muitos anos, são visíveis os transtornos pelos quais passam os moradores desses locais. É de grande importância que haja uma preservação da floresta que margeia o rio Acre, para que haja preservação das vidas de animais e vegetais na localidade, evitando que possa acorrer situação de desmate, caça e pesca predatória. Também é necessário se implantar políticas de acesso à moradia e de educação ambiental, para que os moradores próximos às margens do rio e os visitantes não venham a degradar essas áreas. Portanto, é preciso políticas de inclusão social e uma fiscalização mais acirrada para conscientizar e prevenir contra ações de pessoas que queiram tirar proveito predatório dessas áreas alagadiças.
A natureza é capaz de se auto-sustentar. Todos os elementos do ecossistema estão interligados: os seres vivos, animais e vegetais, relacionam-se uns com os outros e com o meio físico. Isto é a reunião e a interação do ambiente físico ou natural com os seres vivos que aí habitam.
A água é um recurso renovável de fundamental importância para a sobrevivência dos seres vivos, ela é necessária para a vida, para a saúde e para a produção de alimentos. É necessária uma preservação e conscientização por parte do estado, da prefeitura, do poder público e das comunidades, para que as gerações futuras também possam desfrutar desses mananciais, e viverem com dignidade na localidade que “escolheram” para habitar.